É notório que já passou da hora de se ampliar o debate sobre a legislação vigente referente às construções na cidade do Rio de Janeiro. Em um momento de crise econômica e política que fatalmente refletem na decisão do consumidor em comprar ou não um imóvel, o mercado imobiliário busca se reinventar para proporcionar a chegada de novos investimentos e retomada das vendas de imóveis em larga escala.

E um tema que vem provocando fortes opiniões é a atualização do Código de Obras. Inicialmente através do Projeto de Lei Complementar 40/2017, encaminhado pela Prefeitura do Rio à Câmara Municipal de Vereadores para aprovação, mas que foi restituído ao Poder Executivo para que modificações fossem realizadas.

No documento encaminhado à Câmara em novembro de 2017, o prefeito da cidade do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, destaca que o Código de Obras está desatualizado em relação ao momento atual do município:

-A atual legislação edilícia desta Cidade foi estabelecida na década de 70 do século passado e necessita urgentemente de atualização. Naqueles anos, a visão do ambiente urbano desejável era completamente diferente daquilo que almejamos atualmente. Mesmo as relações entre as pessoas e composição das famílias mudaram profundamente nesse período, e essas novas dinâmicas sociais demandam edificações mais flexíveis que não são permitidas pela legislação atual.

Ainda na argumentação do Poder Executivo, com a legislação atual inúmeras oportunidades de desenvolvimento e geração de empregos são perdidas pelas exigências em vigor nas leis urbanísticas do município. A busca é por uma cidade mais compacta, mais coletiva e com menos deslocamentos por automóveis e maior velocidade no ir e vir cotidiano.

Como o projeto de Lei Complementar 40/2017 foi devolvido à Prefeitura, um novo PLC, numerado como 43 do mesmo ano, substituiu o arquivo antigo na tentativa de promover a atualização do Código de Obras e Edificações Simplificado do Rio de Janeiro.

Entre os objetivos principais da Prefeitura para que a nova Legislação seja aprovada está a tentativa de desburocratização do processo de construção, através da simplificação do Código de Obras com a redução de artigos, de 600 para 40, além de atualizar o documento com o estilo de vida que se leva hoje em dia, buscando proporcionar uma nova maneira de construir, levando em consideração a evolução das técnicas de construção e os aparatos tecnológicos.

-É necessário lutar pela aprovação de Leis complementares ao Plano Diretor. Conseguindo isso, vamos proporcionar crescimento do município, dos profissionais do mercado imobiliário e do segmento da construção civil – comenta o corretor de imóveis e especialista em planejamento urbano – Adenil Costa.

Caso o novo Código seja aprovado, não seria necessário a análise por parte da prefeitura de todos os detalhes dos projetos para concessão de licenças. Profissionais arquitetos e engenheiros passariam a ter autonomia para decidir sobre a organização interna das construções. Desta forma, a Prefeitura passaria a analisar apenas aspectos gerais, ou seja, se o gabarito da construção está de acordo, bem com os limites de área construída, podendo, assim embargar obras, aplicar multas e exigir demolições.

Ao longo dos anos, o Rio de Janeiro mudou, assim como as necessidades da população. Muitas pessoas optam por não possuir condução própria e utilizam os transportes de massa. O projeto do novo Código cria a possibilidade de construção de prédios sem garagem em localidades com ampla oferta de transporte. Essas áreas serão definidas posteriormente por Lei Complementar. Atualmente, a legislação prevê de uma a três vagas por unidade.

Para prédios com até cinco andares não haverá a necessidade de instalação de elevadores. A obrigatoriedade passa a existir em edifícios de seis ou mais pavimentos, como consta no artigo 26 do projeto de Lei Complementar 43/2017:

Art. 26. As edificações com seis ou mais pavimentos de qualquer natureza, excluindo os subsolos e incluindo os pavimentos de uso comum, estacionamento e cobertura com unidades independentes estão obrigadas e instalar ao menos um elevador.

§ 1º Para edificações com dez ou mais pavimentos, será exigida a instalação de ao menos dois elevadores.

Outra mudança pretendida diz respeito à metragem dos imóveis. No artigo 11 consta que a média da área privativa de todos as unidades de cada edifício ou lote, deverá ser de, no mínimo, quarenta e dois metros qua­drados em todo o município, sendo que para edifícios com até doze unidades, a área mínima privativa média será de trinta e cinco metros quadrados. No geral, atualmente, com exceção da Zona Norte da cidade, os imóveis necessitam ter pelo menos 47 metros quadrados, excetuando as varandas.

Com a projeção de imóveis mais reduzidos, entre as alterações propostas está a possibilidade de integração da sala à cozinha. E com a autonomia para arquitetos e engenheiros decidirem sobre a disposição dos espaços internos é bem provável que se incremente a oferta de imóveis com plantas diferenciadas e ambientes integrados.

Sobre as varandas, caso o projeto seja aprovado na íntegra, as mesmas deixam de ser computadas como área edificável. Além disso, o novo Código de Obras prevê também mudanças na distância entre a varanda e a testada(limite) do terreno que passa de dois metros para um.

O projeto também aborda a readequação do potencial construtivo de prédios tombados ou preservados, permitindo a reconversão de edificações tombadas, desde que sejam garantidas as condições de proteção do patrimônio cultural também devendo passar pela aprovação dos órgãos competentes. No mesmo terreno poderá ser construído um segundo imóvel, devendo ser mantidas as mesmas dimensões do imóvel tombado, com a obrigatoriedade de também ser autorizado pelos órgãos de preservação.

Talvez o ponto mais polêmico do Projeto de Lei Complementar seja o artigo 37 que prevê a reconversão para o uso multifamiliar nas edificações já existentes construídas de forma regular e devidamente licenciadas, através de uso e desdobramento das unidades.

A discussão se configura pois devido esse artigo específico a Câmara Municipal devolveu o Projeto de Lei inicial para a Prefeitura, alegando a invasão de competência do legislativo. A ideia inicial era permitir a mudança do uso de hotéis para prédios residenciais. A transformação ocorreria através do pagamento da mais valia – aumento do valor do bem através de melhorias ou benfeitorias aplicadas. No novo texto, não fica afastada a possibilidade de alteração de uso de hotéis para prédios residências, apesar da não inclusão explícita no projeto em relação ao texto original.

Lei de Uso e Ocupação do Solo

Além da análise do Projeto de Lei Complementar 43/2017, a Câmara Municipal tem na pauta outras propostas encaminhadas pela Prefeitura como o PLC 57/2018, que prevê alterações na Lei de Uso e Ocupação do Solo e que impactariam os investimentos na cidade do Rio de Janeiro e, consequentemente no mercado imobiliário.

Assim como no projeto de Lei Complementar que visa alterar o Código de Obras, no PLC 57/2018 estão previstos incentivos à reconversão de edificações por meio de transformação de uso ou pelo desdobramento das unidades, destacando que os edifícios necessitam ter mais de dez anos de construção e licenciamento, incluindo também aqueles que estão obras paradas em estágio de estrutura. Tal iniciativa permitiria a transformação de uso a partir do aproveitamento da volumetria já existente, sem restrições de área mínima das unidades. Lembrando que não serão contemplados com este benefício, os hotéis que receberam incentivos pela Lei Complementar 108/2010 (que instituiu isenções e benefícios para construção de hotéis para as Olimpíadas e que necessariamente deveriam ter sido concluídos até maio de 2016).

Um dos principais objetivos deste Projeto de Lei é reordenar o território municipal de acordo com as Macrozonas, as Áreas de Restrição à Ocupação, o Sistema de Centros e Subcentros e os Vetores de desenvolvimento Orientados ao Transporte, que indicarão os padrões de ocupação e de intensidade dos usos do solo, as prioridades de investimentos e os instrumentos que serão aplicados no controle de desenvolvimento urbano.

O projeto detalha e complementa o Macrozoneamento estabelecido no Plano Diretor e divide o município em seis macrozonas, definindo e servindo como referência para orientar o Poder Público nas ações de planejamento e desenvolvimento urbano:

I – Macrozona de Ocupação Controlada

Perfil: áreas consolidadas, com patrimônio cultural e natural de grande valor. Para essa Macrozona as diretrizes de ocupação são:

– limitar o adensamento à capacidade de suporte da área.

– promover a ocupação ou reconversão de imóveis vazios ou subutilizados, em especial das edificações tombadas ou preservadas, como também projetado na atualização do Código de Obras

– estimular o uso residencial nas áreas centrais da cidade

II – Macrozona de Ocupação Incentivada

Perfil: áreas consolidadas, ainda com potencial de adensamento, dotadas de infraestrutura de trans­portes, com as seguintes diretrizes de ocupação:

– estimular o adensamento nas áreas de com maior infraestrutura,

– estimular o uso residencial e a mistura dos usos ao longo dos eixos de transporte,

– promover a reconversão e a ocupação de imóveis vazios ou subutilizados,

– estimular o incrementos de atividades econômicas, fortalecer as centralidades locais e a relação com a região metropolitana

III – Macrozona de Ocupação Condicionada:

Perfil: áreas que necessitam de infraestrutura e alta vulnerabilidade ambiental, com os seguintes apontamentos para construção:

– restringir a o adensamento à capacidade de suporte local

– melhorar a infraestrutura de saneamento,despoluir e proteger áreas de interesse ambiental

– condicionar a ocupação urbana ao aporte público ou privado de investimentos em infraestrutura e meio ambiente

– fortalecer as centralidades ao longo dos eixos estruturadores de transportes

IV – Macrozona de Ocupação Assistida:

Perfil: Áreas de expansão da cidade, com vulnerabilidade social e pouca infraestrutura, com as seguintes diretrizes de ocupação:

– condicionar o adensamento a investimentos em infraestrutura e proteção sócio-ambiental

V – Macrozona de Qualificação e Proteção Ambiental:

Perfil: Localidades de conservação ou preservação ambiental, com vulnerabilidades e baixa intensidade de ocupação, com os apontamentos de ocupação:

– compatibilizar o uso do solo às legislações de proteção ambiental e cultural

– fomentar atividades econômicas de baixo impacto

– reduzir situações de vulnerabilidade socioambiental

VI – Macrozona de Estruturação Econômica e Metropolitana

Perfil: áreas limítrofes aos municípios da Região Metropolitana, articuladas por vias estruturais, com as seguintes diretrizes de ocupação

– viabilizar a instalação de novas atividades econômicas de grande porte na Região Metropolitana, como complexos industriais e logísticos

– qualificar os sistemas de transportes

– recuperar a qualidade ambiental, estimular a regularização de habitação nas zonas com oferta adequada de infraestrutura e transportes

– Na década de 80 observou-se o crescimento da Barra da Tijuca, incluindo a Península considerada, na época, de novo Leblon. Mas hoje não tem mais jeito, ou muda a legislação e faz com que a cidade cresça no sentindo da Avenida Brasil, podendo incluir até a Gamboa pra cima. Considero um erro do Governo ter feito um amplo investimento no Porto e não ter fomentado as residências na região. O maior Centro de Logística no Rio de Janeiro está atualmente entre Campo Grande e Santa Cruz. Grandes empresas já montaram os centros de distribuição nessa região – destaca Adenil Costa.

Tanto o projeto de Lei Complementar 43/2017 quanto o 57/2018 estão em tramitação na Câmara Municipal. Recomenda-se a leitura completa da legislação disponível no portal: www.camara.rj.gov.br/