“O corretor é um dos principais atores do mercado imobiliário. Têm a incumbência de conferir segurança àqueles que transacionam seus imóveis.”

Presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) desde 2013, Ricardo Basto da Costa Coelho foi diretor de eventos, vice-presidente e presidente do Conselho Deliberativo da entidade. Atuou também como diretor da Associação dos Serventuários da Justiça do Paraná e presidente do Colégio Registral do Paraná

Atualmente é diretor da Anoreg/BR e membro do Comitê Latino Americano de Consulta Registral.

Nesta entrevista exclusiva à Revista Stand, Ricardo Basto fala sobre o papel do corretor de imóveis, a importância do registro imobiliário e a Medida Provisória 656/2014(que entre outras disposições institui a concentração dos atos na matrícula do imóvel).

 

1 – Como presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil, como o Sr. enxerga o papel e a atuação do corretor de imóveis hoje perante a sociedade?

 

O corretor é um dos principais atores do mercado imobiliário, que juntamente com notários e registradores têm a incumbência de conferir segurança àqueles que transacionam seus imóveis.

E temos visto com muita alegria a atuação do Creci em todo Brasil, promovendo cursos, congressos, seminários e debates profícuos com vistas à qualificação contínua desses profissionais. E o reflexo disso é sentido no dia a dia das serventias notariais e de registro, onde percebemos que os profissionais mais qualificados têm ganhado espaço no mercado, pois são verdadeiros assessores das partes, conhecedores das inúmeras e intrincadas normas jurídicas afetas ao seu mister.

2 – Como funciona hoje o Registro de Imóveis no Brasil? O sr. poderia nos dar uma visão para o corretor de imóveis e, até mesmo, o cidadão comum saber como são realizados os registros imobiliários?

 

As terras dos municípios e do Distrito Federal estão divididas em circunscrições imobiliárias. Cada circunscrição tem o seu Cartório de Registro de Imóveis, e este é responsável por registrar ou averbar todos os atos relativos aos imóveis que estejam dentro da sua circunscrição. Portanto, como regra, todo imóvel pertence apenas a uma circunscrição, salvo aqueles que porventura estejam em situação limítrofe entre mais de uma circunscrição; neste caso, o imóvel terá uma matrícula em cada circunscrição, onde uma deve se referir e refletir a outra.

A matrícula é a representação jurídica do imóvel. É o ato cartorário que individualiza o imóvel, identificando-o por meio de sua correta localização e descrição. É na matrícula do imóvel que são lançados todos os atos de registros e averbações, fatos ou negócios jurídicos relativos a ele, mostrando a real situação jurídica do imóvel. A matrícula funciona como um retrato do imóvel contendo todo histórico anotado nos livros do Cartório.

Tecnicamente, o termo “registro” é a designação do ato cartorial que contém uma constituição ou transmissão de direito real sobre o imóvel, sendo o principal deles a propriedade (outros direitos reais são: hipoteca, superfície, usufruto, direito de promitente comprador, propriedade fiduciária etc.). Já a “averbação” é o ato cartorário próprio para formalizar cancelamentos de outros atos que estão lançados na matrícula (exemplo: cancelamento de um registro de hipoteca em virtude da quitação da dívida, cancelamento de penhora etc.), ou alterações no imóvel ou no titular de direitos sobre ele (exemplo: averbação de construção ou demolição, averbação de casamento do proprietário etc.).

E para que se faça qualquer ato cartorial, seja registro ou averbação, é preciso que o interessado leve ao cartório o documento (também chamado de “título”) que contém o ato, fato ou negócio jurídico a ser dado publicidade. O registrador vai examinar o título, e se entender que está conforme a lei realizará o ato registral devido, caso contrário, fará uma nota devolutiva elencando o(s) motivo(s) pelo(s) qual(is) não poderá efetuar o ato. Caberá ao interessado cumprir as exigências ou pedir ao registrador que leve o assunto ao juiz competente, para que decida se a recusa é legal ou não, é a chamada “suscitação de dúvida registraria”. Se o juiz entender que o registrador está equivocado em sua análise mandará que faça o registro ou averbação, se não, o protocolo do título será cancelado e ao interessado só restará providenciar o cumprimento das exigências para depois pedir o registro ou averbação novamente.

 

3 – O registro do imóvel transfere de fato a posse da propriedade do antigo dono ao comprador. O que pode ocorrer numa negociação imobiliária onde a escritura não é registrada? Quais os riscos para o comprador?

 

Inicialmente cabe dizer que a finalidade maior do Registro de Imóveis é dar publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos, fatos e negócios jurídicos relativos aos bens imóveis.

No caso da propriedade dos bens imóveis (assim como os demais direitos reais imobiliários), a sua constituição ou transferência somente se opera com o registro do título aquisitivo no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição imobiliária competente (art. 1.227 do Código Civil). Somente desta forma que o adquirente/comprador poderá se valer da garantia constitucional do direito à propriedade (artigo 5º, inciso XXII da Carta Magna). Daí se extrai o famoso bordão “Só é dono quem registra!” ou “Quem não registra não é dono!”.

Mas, como já falamos, para que o registro aconteça é preciso que o título aquisitivo seja levado ao Cartório de Registro de Imóveis competente, e, via de regra, por força do art. 108 do Código Civil, esse título é a escritura pública de aquisição, seja por compra e venda, permuta, doação etc.

Por isso, nunca devemos esquecer-nos de levar a registro o título aquisitivo da propriedade do imóvel, bem como evitar realizar a prática do contrato de gaveta (venda através de contrato particular sem registro), pois o título aquisitivo sem registro não transfere a propriedade.

Caso não venha a ser noticiado o negócio da compra e venda de determinado imóvel no registro imobiliário, este restará precário, ficando descoberto de oponibilidade a terceiros, da ampla publicidade, controle, eficácia, segurança e autenticidade das relações jurídicas envolvendo imóveis, garantias estas que só são adquiridas com o efetivo registro do título, que nada mais é do que a prova cabal da propriedade.

 

4 – Atualmente, quais são as principais pendências na hora de registrar o imóvel. Quais os pontos em que se deve ter maior atenção para não cair em exigência e atrasar a concretização de uma negociação imobiliária.

 

Na verdade, quando os negócios imobiliários são celebrados através de escritura pública, que são instrumentos lavrados por tabelião de notas, as exigências, quando existentes, geralmente dizem respeito à correções de pequenos erros materiais encontrados na escritura (por exemplo, digitação errada do nome do vendedor), que são facilmente corrigidas.

Entretanto, em alguns casos específicos, a lei permite a transmissão de direitos reais imobiliários através de contratos particulares, como é o caso dos instrumentos lavrados por bancos dentro do SFH (Sistema financeiro da Habitação) e SFI (Sistema Financeiro Imobiliário), bem como através de títulos judiciais (formal de partilha, carta de arrematação, carta de adjudicação etc.).

E eventualmente quem formaliza tais instrumentos não possui o conhecimento técnico específico para a confecção de instrumentos de transmissão de direitos reais imobiliários, ocasionando muitas vezes documentos que não observam a continuidade dos registros, a descrição correta do imóvel objeto do negócio ou mesmo alguma restrição jurídica ao poder de disponibilidade do proprietário. Nesses casos, a registrabilidade do título fica seriamente comprometida, o que pode gerar prejuízo às partes contratantes.

 

5– Recentemente entrou em vigor uma Medida Provisória editada pelo Governo, a nº 656/2014. Nela são abordadas importantes mudanças para quem atua nos negócios imobiliários. Qual a sua avaliação sobre a medida? O que realmente muda para os agentes do mercado imobiliário?

 

A MP 656/2014 foi uma importante conquista obtida pelos registradores e demais operadores dos negócios imobiliários. Com ela, foi instituído o que chamamos de princípio da concentração da matrícula, que é a concentração de todas as informações referentes à propriedade do bem, centralizadas em um único documento no registro do imóvel (matrícula), com isto, tal medida trará mais agilidade e segurança aos negócios imobiliários.

Com a nova medida, todas as ações judiciais que ingressarem em juízo sobre determinado imóvel, deverão ser averbadas na matrícula do imóvel, trazendo garantias ao comprador nas transações imobiliárias.

Isso ocorre porque, a partir do momento em que ele retirar a certidão atualizada e verificar que não há nenhuma ação contra seu proprietário averbada, terá a segurança de que o imóvel não será requerido por demandas judiciais originadas antes da compra.

Sendo assim, o ponto destacado é a redução da burocracia no momento da compra ou da solicitação do financiamento imobiliário, já que será preciso retirar apenas uma certidão de matrícula atualizada, e não uma série de certidões, para comprovar a segurança do negócio.

 

7 – Uma Lei pouco conhecida, a 6.015/73 dá direito a desconto de 50% na escritura do primeiro imóvel adquirido com recursos do SFH. O sr. poderia nos dizer o que é preciso para obter o desconto? E a legislação impõe algum limite para o cidadão obter o benefício?

 

Realmente o art. 290 dessa lei é pouco conhecido pelos leigos, no entanto deve ser conhecida por todos os corretores de imóveis no exercício de suas funções. Trata-se da Lei nº 6015/73, Lei de Registros Públicos, que é o diploma legal mais usado pelos profissionais do ramo imobiliário. É lá que encontramos toda estrutura dos registros públicos, onde está inserido o registro imobiliário. Esse artigo estabelece que “os emolumentos devidos pelos atos relacionados com a primeira aquisição imobiliária para fins residenciais, financiada pelo Sistema Financeiro da Habitação, serão reduzidos em 50%”.

Emolumentos é o nome que se dá à remuneração de notários e registradores pelos atos que praticam, e que devem ser pagos pelo interessado no momento da solicitação do serviço. Dessa forma, é o interessado que deve declarar (os cartórios exigem essa declaração por escrito) no momento da prenotação (protocolização) do título que se trata da aquisição do primeiro imóvel residencial da pessoa. O funcionário do cartório confirmará se realmente se trata de aquisição dentro do SFH, através da simples leitura do título aquisitivo (escritura ou instrumento particular), e, confirmando, dará o desconto.

O limite é justamente ser financiado pelo SFH e ser o primeiro imóvel residencial da pessoa. É o que está na lei. Portanto, se a aquisição é pelo SFI, ou se a pessoa tem ou já teve imóvel residencial em qualquer lugar não fará jus ao desconto. É certo que para financiar imóvel pelo SFH há limite de valor, mas quem verifica tal requisito é o agente financiador; se chegar ao cartório o instrumento de aquisição informando que se trata de aquisição dentro do SFH penso que o requisito da lei está cumprido.