Poucos lugares no Brasil – e provavelmente no mundo – são tão charmosos quanto o Leblon, na Zona Sul cio Rio de Janeiro. Cenário frequente das novelas do escritor Manoel Carlos, da TV Globo, que mora há 40 anos no bairro, o Leblon é o endereço preferido de boa parte da elite política, econômica e cultural que vive no Rio. Oferece o que há de melhor na sociedade de consumo, como shoppings, bares, restaurantes e uma vida noturna movimentada. Também conserva características de bairro residencial. Embora esteja localizado na orla, ao lado da Praia de Ipanema, numa das regiões mais belas da cidade, tem enclaves tranquilos com atmosfera de cidadezinha do interior. O Leblon ficou em primeiro lugar na lista dos bairros mais cobiçados do Brasil, segundo o Anuário do mercado imobiliário brasileiro 2013 – um levantamento realizado pela Lopes Consultoria de Imóveis, uma das principais empresas do setor no país, publicado com exclusividade por Época.

Praticamente sem terrenos disponíveis e com uma demanda crescente de moradores potenciais, o Leblon é um exemplo perfeito de como funciona a lei da oferta e procura. No ano passado, o bairro recebeu um único lançamento, de acordo com o estudo da Lopes, com apenas cinco apartamentos de alto padrão. Cada unidade, com 150 me¬tros quadrados, custou cerca de R$ 5,3 milhões, ou R$ 34.870 por metro quadrado. Apesar de ser bem superior ao de qualquer outra região do país, o preço no Leblon, equivalente a cerca de US$ 15 mil por metro quadrado, ainda pode ser considerado relativamente baixo para os padrões  internacionais. No condomínio One57, ao lado do Central Park, em Nova York, o metro quadrado custa em torno de US$ 100 mil, quase sete vezes isso. É praticamente o mesmo preço de um imóvel perto do Hyde Park, em Londres, ou na exclusivíssima Monte Cario, em Mônaco. “Os bairros mais cobiçados se concentram onde está o dinheiro”, afirma Mirella Parpinelli, diretora da Lopes.

O estudo, realizado pela área de pesquisa imobiliária da Lopes pelo terceiro ano consecutivo, monitorou os lançamentos de edifícios residenciais em 134 cidades no ano passado. Além de acompanhar a valorização do mercado de imóveis novos, com base no critério tradicional da mediana dos preços por metro quadrado (o valor que divide a amostra estudada em duas metades iguais, uma com preços superiores, outra com inferiores a ele), a Lopes também lançados, além da área privativa e do número de dormitórios dos apartamentos.

Na lista dos mais valorizados do país, o segundo lugar ficou com o Itaim Bibi, na Zonal Sul de São Paulo. No Itaim, o preço do metro quadrado mediano dos lançamentos ficou em R$ 22.940, 35% abaixo do Leblon. Quem mora no Itaim está perto de alguns dos shoppings mais sofisticados da cidade e do comercio mais popular da Rua João Cachoeira, que corta o bairro. Também está perto de dois grandes parques, o Ibirapuera e o Parque do Povo. Conta com uma noite agitada – para muitos, mais agitada do que poderia desejar quem valoriza uma tranquila noite de sono. Logo em seguida no ranking, praticamente colados ao Itaim, ficaram o Ibirapuera e o Jardim Europa, dois tradicionais bairros paulistanos. Entre os 25 bairros mais valorizados do Brasil, 18 estão em São Paulo e quatro no Rio de Janeiro, um resultado até certo ponto previsível, considerando a população e o custo de vida nas duas cidades.

O estudo da Lopes trouxe também algumas surpresas. Na lista das cidades com o preço mediano do metro quadrado mais caro, 11 não são capitais, entre elas Niterói, no Rio de Janeiro, Campinas e Santos, em São Paulo, e Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco. O primeiro lugar da lista ficou com Brasília, onde o preço do metro quadrado alcançou R$ 10.960, quase o dobro do resultado nacional, de R$ 5.560, calculado pela Lopes com base nos valores dos 1.342 empreendimentos residenciais lançados no país em 2013.

A grande surpresa da pesquisa foi Goiânia. A cidade liderou o ranking de valorização dos imóveis no país, com uma alta de 39,2% no valor do metro quadrado. Outras cidades de médio porte registraram valorizações expressivas, como Sumaré, em São Paulo, com 29,2%, São José, em Santa Catarina, com 26,3%, e Vila Velha, no Espírito Santo, com 24,2%. Embora o preço do metro quadrado nessas cidades seja menor que nas grandes metrópoles, a alta foi maior.

A pesquisa revelou também que os preços dos imóveis começam a entrar num momento de acomodação, depois da explosão dos últimos anos. Os preços medianos dos lançamentos no Rio de Janeiro em 2013 subiram 9,7%, um pouco acima da inflação e menos que em anos anteriores. Em outras capitais, eles subiram menos que a inflação ou até caíram. Em Brasília, o preço mediano do metro quadrado caiu 0,5% no ano passado, em relação a 2012. Em Curitiba, a queda chegou a 6%. Em Florianópolis, a 24,6%, a maior do país. “A visão da economia hoje é pior do que as pessoas tinham no passado”, afirma Cláudio Bernardes, presidente do Secovi paulista, entidade que reúne os empresários do setor de construção no Estado. “Isso leva ao adiamento da decisão de compra.”

Nos primeiros meses de 2014, a retração observada em algumas cidades no ano passado parece se alastrar. Em São Paulo, maior mercado do país, um levantamento feito pela Empresa Brasileira de Estudos do Patrimônio (Embraesp) e pela Lopes mostra que os preços do metro quadrado de lançamentos caíram 10,33%, já deduzida a inflação do setor de construção. Eles voltaram ao patamar de 2012. No primeiro bimestre do ano, o Secovi de São Paulo registrara queda de 27,5% nas vendas, em comparação com 2013.

Há quem tema a existência de uma bolha especulativa. Na semana passada, o economista americano Robert Shiller, prêmio Nobel de Economia em 2013, voltou a mostrar preocupação com a questão. “O mercado hipotecário ainda se desenvolve no Brasil, e os erros podem facilmente acontecer”, afirmou. O ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles disse que “claramente em algumas regiões do Rio de Janeiro e de São Paulo” há uma bolha imobiliária, embora afirme que, no Brasil, ao contrário do que ocorreu nos Estados Unidos, ela “não contaminou a economia real”.

No setor imobiliário, quase todo mundo nega a existência da bolha. O principal argumento é que, no Brasil, o crédito imobiliário equivale a apenas 8% do PIB, em comparação com os 70% dos Estados Unidos e com os 75% do Reino Unido. Pelo sim, pelo não, com a retração dos compradores, as construtoras e incorporadoras diminuíram os lançamentos. De acordo com a Embraesp, houve uma queda de 26,6% no número de unidades residenciais lançadas em São Paulo no primeiro trimestre, em relação ao ano passado. “O mercado passou por um longo período positivo, eufórico até”, diz Luiz Henrique Rimes, diretor de negócios da João Fortes, uma das maiores construtoras do país. “É importante as empresas se anteciparem e se prepararem para evitar uma crise.” A expectativa é que, em 2014, o número de lançamentos seja parecido com 2013. Não foi um ano ruim, apesar das incertezas políticas e econômicas. Em endereços cobiçados como o Leblon e o Itaim Bibi, provavelmente a demanda continuará alta.

Fonte: Revista Época – 07/05/2014