Formada em arquitetura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Maria Madalena Saint-Martin, em entrevista exclusiva à Stand, fala sobre planejamento urbano, Plano Diretor, sustentabilidade, entre outros temas. Ela foi subsecretária de urbanismo em quatro mandatos no município do Rio de Janeiro, tem experiência tanto nas coordenadorias de licenciamento e fiscalização como na área de planejamento. Participou do grupo de revisão do Plano Piloto da Barra da Tijuca com o arquiteto Lucio Costa em 1982, trabalhou na Comissão de elaboração do Plano Diretor em 1992 e na revisão do mesmo realizada quase vinte anos depois. Traz na bagagem, a legislação do Porto Maravilha e do Pacote Olímpico da cidade do Rio de Janeiro.

Para que uma cidade se desenvolva de maneira  ordenada e satisfatória, como deve ser elaborado e quais os itens devem ser analisados em um planejamento urbano?

Dentre os diversos indicadores considerados na hora de se planejar a Cidade, avaliamos a mobilidade,as fragilidades ambientais, a preservação da  paisagem, a disponibilidade de infraestrutura. No entanto, o fator preponderante que conecta todos estes elementos estruturadores é a qualidade de vida dos moradores. Neste contexto, o Município vem concentrando esforços para continuamente atualizar as normas urbanísticas que orientam o planejamento da Cidade, algumas elaboradas na década de 70. Logo, após a aprovação do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Sustentável do Município, do Rio de Janeiro, em 2011, a Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU) vem discutindo com a sociedade, em audiências públicas, a regulamentação dos instrumentos gerais de regulação urbanística, edilícia e ambiental, conforme orientação do próprio Plano. Foram estabelecidos conceitos e regras, respectivamente, para organizar a ocupação do espaço urbano da cidade, normas gerais que disciplinam o parcelamento do solo, normas para a elaboração de projetos e para a construção, buscando garantir a preservação da paisagem da cidade e das suas edifi cações e normas para execução de todas as obras de construção, reconstrução, modifi cação, reformas, contenção, canalização e drenagem.

Com a publicação do Plano Diretor em 2011 quais as regiões da cidade onde existem maiores possibilidades de crescimento? Quais os fatores que propiciam essa possibilidade?

 O Plano Diretor definiu um novo conceito de Macrozonas de Ocupação que estabelece em quais áreas  deve ser estimulado o crescimento. É dado destaque à Macrozona Incentivada que abrange grande parte da Zona Norte da Cidade, região dotada de infraestrutura e que vem recebendo significativos investimentos do poder público para sua revitalização, inclusive com a construção de grandes Corredores de BRT como Transcarioca, a Transolímplica e a Transbrasil. Além destes dois vetores é relevante a recuperação da Área Central do Rio de Janeiro. Isso significa recuperar o coração da cidade e consequentemente, revitalizar toda o município. Dois grandes projetos são destaque: o Porto Maravilha e a Cidade Nova. O Porto Maravilha reestrutura uma região de grande importância para o Município, atraindo grandes empreendimentos, integrando-a ao restante do Centro e fortalecendo o papel da cidade no contexto nacional e internacional e a Cidade Nova no propósito de dotar a área de infraestrutura, rever a legislação com vistas a possibilitar uma nova dinâmica urbana para esta região, periférica à área central, com grande potencial de expansão, além da recuperação do patrimônio cultural, considerando o expressivo número de imóveis preservados.

 De que maneira os conceitos sustentáveis estão sendo incluídos nos projetos da Secretaria Municipalde Urbanismo?

O desenvolvimento sustentável apresenta-se como a chave para o crescimento adequado da Cidade. As ações da Secretaria de Urbanismo se pautam por esta premissa básica, desde o ato de legislar sobre o uso e ocupação do solo, quando primamos pela mescla de usos residenciais aos de comércio e serviços favorecendo deslocamentos a pé, até a escala do desenho urbano, quando projetamos ciclovias,praças e parques urbanos. O Rio de Janeiro, consagrado por sua paisagem belíssima, impõe à Prefeitura da Cidade perseguir este objetivo, ou seja, promover um desenvolvimento urbano sustentável de forma harmônica com a preservação da paisagem, dos maciços e morros e das florestas, conforme previsto no Plano Diretor. Cabe ressaltar ainda que há outras iniciativas importantes, capitaneadas pela SMU. Dentreelas, a de incentivo a novos empreendimentos que contenham ações e projetos sustentáveis destinados a redução dos impactos ambientais, para tanto, criou a certificação Qualiverde – Decreto 35.745, selo verde para edificações que não agridam o meio ambiente.

 O Rio de Janeiro atravessa um boom de lançamentos imobiliários. De que maneira deve acontecer esse crescimento do mercado sem prejudicar o planejamento urbano?

É fundamental atender às diretrizes para o planejamento  urbano da cidade, estabelecidas pelo Plano Diretor e pelas legislações locais para o bairro. Desta forma, a Secretaria Municipal de Urbanismo, através da elaboração dos PEUs (Planos de Estruturação Urbana) e atendendo às diretrizes do Plano Diretor por macrozonas, busca acompanhar a dinâmica urbana da Cidade, de modo a reverter o processo de degradação de algumas áreas e evitar o crescimento desordenado de outras.

 O país apresenta um déficit habitacional ainda acentuado. No Rio de Janeiro, de que forma pode  ocorrer a redução desse déficit com uma ocupação ordenada da cidade?

O principal instrumento de enfrentamento do déficit habitacional está na Lei Complementar 97 de julho de 2009, que estabelece as diretrizes e parâmetros para implantação do Programa Minha Casa Minha Vida no Município do Rio de Janeiro. Até o final de agosto de 2013 já foram licenciados 72.560 unidades do citado Programa na cidade. Destas, 62% estão na Zona Oeste e 21% na região da Central e Leopoldina.Segundo as faixas de renda (em salários mínimos), o total de unidades licenciadas dividem-se em: de 0 à 3 – 43%; de 3 à 6 – 20% e de 6 à 10 – 37%. Outro programa importante da SMU é a regularização urbanística em Áreas de Especial Interesse – AEIS.

 Quais são os principais desafios que a senhora têm à frente da Secretaria de Urbanismo da Prefeitura do Rio de Janeiro?

Promover o desenvolvimento urbano do Rio de Janeiro de forma equilibrada e harmônica, em consonância com a sua paisagem, seu bem mais valioso, o meio ambiente e o patrimônio histórico e cultural, marcas desta cidade, garantindo a qualidade de vida da população.

Qual é o papel da Secretaria Municipal de Urbanismo nas grandes transformações que a cidade está passando para os grandes eventos?

As mudanças que vêm ocorrendo, aconteceram com a escolha do Brasil como sede da Copa de 2014 eda cidade como sede das Olimpíadas de 2016. A partir de 2009, iniciaram-se as obras, conforme previsto no Caderno de Encargos e no legado, com as Trans: Transcarioca, Transoeste e Transolímpica e a implantação dos BRT’s. Com o túnel da Grota Funda e a admissão do transporte coletivo viabilizou-se a Transoeste e a mobilidade dos moradores de Santa Cruz e Campo Grande em direção ao mercado de trabalho da Barra da Tijuca. Nesse mesmo ano de 2009, novas fronteiras são abertas, considerando-se os megaeventos. Entre as principais iniciativas está a criação da AEIU do Porto, decisiva para uma reorientação consistente dos vetores de crescimento da cidade. O Riode Janeiro é um bom exemplo de cidade, onde áreas antes decadentes, vêm se recuperando, seja por meio de revitalização (retrofit) de belos prédios, seja como efeito de demolição e construções novas. Com o Plano Diretor aprovado em 2011, foram aprovadas legislações específicas com foco na Zona Norte, que vieram promover a revitalização e requalificação de importantes áreas da cidade, áreas essas em processo de estagnação e decadência do ambiente urbano, a exemplo de: área do PEU da Penha, com propósito de revigoramento do uso residencial; Área de Especial Interesse Funcional da Ilha de Bom Jesus, na Cidade Universitária, que viabilizou a criação de parque tecnológico, e a Área de Especial Interesse Urbanístico da Avenida Brasil, que define normas para incremento das atividades econômicas e para o reaproveitamento de imóveis em áreas das zonas industriais e ao longo dos corredores viários estruturantes das zonas norte e oeste.