A concentração no cartório de registro de todas as informações do imóvel relativas a débitos e garantias de dívidas, medida anunciada recentemente pelo governo para aumentar a segurança jurídica e reduzir custo para o setor imobiliário, só terá efeito prático no prazo de dois anos. A Medida Provisória que vai regulamentar o tema, que deve ser publicada nos próximos dias no Diário Oficial, dará prazo até janeiro de 2015 para averbar novas dívidas ao imóvel. Além disso, o prazo de inclusão na matrícula do estoque de ações em tramitação na Justiça será de dois anos, a partir da publicação da MP. A equipe econômica defendia um período menor, mas foi vencida pelo Ministério da Justiça, que alegou a necessidade de garantir os direitos dos credores, sobretudo trabalhistas.

O Ministério da Fazenda vem discutindo o assunto desde 2005 e, além das resistências do Ministério da Justiça, enfrenta o lobby de alguns cartórios, que querem manter o filão com a emissão de certidões negativas. A concentração na matrícula é um pleito antigo do setor imobiliário, que vai beneficiar, principalmente, o comprador do imóvel ao reduzir os riscos da operação. Atualmente, acontece casos de consumidores, que depois de comprarem um imóvel, que pertenceu a mais de um proprietário, se surpreendem com a sentenças judiciais, anulando a operação.

A medida também vai evitar exigências atuais, como uma série de certidões negativas pedidas pelos bancos antes de conceder o financiamento ao mutuário pela inexistência de um registro que englobe tudo o que diz respeito ao imóvel. Os agentes financeiros também têm custo elevado com o processo de análise jurídica, despesas com advogados e cartórios. Quando a medida estiver vigorando plenamente, qualquer dívida que não estiver averbada à matrícula não terá validade para terceiros. Ou seja, os credores não conseguirão alcançar esse imóvel.

— O maior beneficiado é o comprador que não correrá mais riscos, ao comprar um imóvel com matrícula limpa. No longo prazo, é possível que haja uma queda nas taxas de juros, porque os custos para os agentes financeiros serão reduzidos e a tendência é o repasse para os preços — disse um executivo de um grande banco.

A equipe econômica também estuda incluir na mesma MP as regras do novo instrumento de captação do mercado imobiliário, que está sendo criado pelo governo: as Letras Imobiliárias Garantidas (LIGs), com isenção de Imposto de Renda para pessoas físicas e investidores estrangeiros nas aplicações com prazo médio de dois anos. Os papéis terão uma nova fórmula de remuneração, que poderá ser taxa fixa, índice de preços e correção cambial. Neste caso, o emissor deverá fazer hedge. O prazo de vencimento do papel deverá ser de dez anos.

A principal vantagem do novo papel em relação aos existentes no mercado é a dupla garantia, a oferecida pelo próprio banco e o lastro do financiamento, no caso do imóvel. A carteira dos títulos ficará apartada do contabilidade da instituição financeira para garantir ao investidor maior segurança e prioridade no recebimento em caso de falência e liquidação do banco.

O objetivo do novo papel é criar uma alternativa de fonte de recursos para habitação, além da poupança e do FGTS, e estimular a entrada de pequenos investidores nesse tipo de operação. A medida vai permitir aos bancos comprar carteiras de recebíveis de construtoras e incorporadoras e depois ofertar os papéis no mercado.

Em outra MP já enviada ao Congresso (651), o governo inclui dois artigos que mexem com o setor imobiliário: a permissão para que a intimação do devedor do imóvel possa ser feita pelos jornais e a isenção de tributos (IPTU) e taxas de condomínio para bancos e construtoras. Neste caso, o texto deixa claro que o responsável por essas dívidas é quem tem a posse do imóvel e não o banco, que é proprietário da alienação fiduciária. Prefeitos e síndicos têm direcionado a cobrança de débitos atrasos para os agentes financeiros e as construtoras.

Fonte: Jornal O Globo – 26/09/2014