momento do pontapé inicial da Copa no Estádio do Itaquerão, em São Paulo, ainda está longe. Mas para alguns cariocas, a bola está rolando. Quer dizer, a bola, talvez não, mas o rolo, as marretas e os pincéis estão em campo. É que para lucrar com o Mundial, eles convocaram arquitetos para dar aquela guaribada em imóveis que pretendem alugar durante o período dos jogos. E, assim, garantir um valor melhor, já que, dizem os especialistas, imóveis reformados e bem decorados têm seus aluguéis valorizados entre 30% e 40%. Além disso, o negócio é fechado mais rapidamente.

Não à toa, mesmo faltando tão pouco para o Mundial, ainda há quem esteja correndo contra o relógio para terminar as obras. Os perfis são variados. Há quem esteja reformando o próprio imóvel e queira aproveitar o aluguel para recuperar parte do valor investido na obra, e aqueles que resolveram investir no crescente mercado de aluguel por temporada. A figurinista Márcia Pitanga se encaixa nos dois.

De volta ao Brasil depois de um período morando nos Estados Unidos, Márcia levou um tempo até resolver se desfazer do apartamento que tinha no Jardim Botânico para comprar dois menores: um dois quartos em Botafogo, para morar, e um conjugado em Ipanema, para investimento. Com isso, sobrou pouco tempo para as obras: cerca de três meses. A de Botafogo ainda nem terminou. Já em Ipanema, foram dois meses para deixar pronto o quarto e sala de 40m². Ainda assim, ela faz planos para alugar ambos durante a Copa:

— Pretendo cobrar R$ 800 a diária em Ipanema. Se alugar o mês todo, já recupero os R$ 20 mil que gastei na reforma. Em Botafogo, quero ganhar de R$ 10 mil a R$ 15 mil. Não paga a obra toda, mas não importa, pois vou morar lá.

Entregar uma obra tão rápido, contudo, pode sair mais caro, dizem os arquitetos. Até porque a única forma de acelerar a reforma é contratar mais funcionários e fazer mais turnos. Para dar conta de aprontar um conjugadão de 36m² em apenas um mês, por exemplo, os arquitetos Katia Ibrahim e Luiz Eduardo Pinto chegaram a contratar profissionais para trabalhar à noite.

— Claro que não era nada que fizesse barulho. Mas a pintura, por exemplo, foi toda feita à noite. Ou não seria possível entregar o imóvel tão rapidamente — conta Kátia.

Em casos assim, o metro quadrado da obra pode sair por cerca de R$ 1.400, incluindo a mão de obra e os materiais. O tempo pode ser maior ou menor, dependendo do que precisa ser feito. Mas os arquitetos têm trabalhado com prazos de um a três meses.

— O ideal é fazer em três meses. Se a pessoa quiser criar um lavabo, o que é indicado em imóveis pequenos, por exemplo, deve precisar de mais tempo, pois a obra vai ser maior e vai envolver trocas de encanamento, de posição de banheiro. Mas se for obra mais simples, mesmo com a renovação de instalações hidráulicas e elétricas, dá para fazer em um mês — conta Lisete Gomes, do escritório Odara Arquitetura.

Para quem tem dúvida se investir em temporada é um bom negócio, a Copa é um bom momento para fazer o teste. Pesquisa do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci-RJ) mostra que em alguns casos as diárias cobradas no período dos jogos são até 250% mais altas. Já no site Alugue Temporada, o número de mensagens enviadas aos donos de imóveis das cidades-sedes aumentou 80% entre janeiro e março deste ano, em comparação com o mesmo período do ano passado.

— Não há parâmetro de preços na Copa. Até porque são vários fatores: a vontade de quem quer vir, a falta de opções, em especial agora, já mais perto dos jogos, as vagas limitadas em hotéis — explica Nicholas Spitzman, presidente do site, acrescentando que pesquisas feitas mundialmente pela Home Away, da qual faz parte, mostra que beleza, nesse caso, é fundamental. — As fotos são um dos fatores principais para despertar o desejo do viajante. O direito de pedir um valor maior é mais justificável num imóvel reformado, bem decorado. Tanto que, mesmo mais caro, ele será alugado mais rapidamente.

Que o diga o engenheiro de petróleo Rafael Kolmar, que, desde 2012, administra dois imóveis no Arpoador. Ambos passaram por reformas visando à Copa do Mundo, e o resultado é que já estão alugados para turistas americanos e ingleses, que vão pagar diárias entre mil reais e R$ 2,5 mil. Em períodos fora do Mundial, os valores pedidos variam de R$ 300 a R$ 650.

Arquitetos ensinam como gastar menos para montar um apê de aluguel na última hora

Será, então, que aqueles que deixam tudo realmente para a última hora ainda têm tempo de começar uma reforma? É preciso sorte. Muitos arquitetos já não aceitam obras para a Copa. Até porque ainda estão tocando várias. É o caso, por exemplo, do arquiteto Thoni Litsz, que está com cinco projetos de apartamentos que serão alugados durante o Mundial.

— Tive que recusar dois trabalhos agora em abril. Não daria conta, mesmo que fossem apenas uma maquiagem — diz Thoni, explicando que muitas vezes as reformas não envolvem quebra-quebra. — Quando o tempo é curto, podemos colocar piso sobre piso, trocar louças e a bancada de banheiro e cozinha, fazer uma pintura. Mas mesmo isso, para ficar bem feito, precisa de, ao menos, 30 dias.

O importante, dizem tanto arquitetos quanto corretores, é apresentar um bom imóvel.

— Quando você mora no apartamento, muitas vezes não se importa com o defeitinho no banheiro, um probleminha aqui ou ali, mas a partir do momento que se está cobrando de alguém para ficar ali, é preciso ajeitar tudo. Especialmente, para não fazer feio — ensina Rodrigo Barbosa, da empresa Morabilidade.

Para isso, não basta reformar. É preciso investir também na decoração. A figurinista Márcia Pitanga, por exemplo, fez questão de comprar peças que deixassem o apartamento de Ipanema mais atraente: frigobar em estilo vintage, quarto para casal, futon na sala — que dá charme e ainda serve para receber duas pessoas a mais. A escolha foi baseada em sua experiência, já que Márcia está acostumada a viajar e a se hospedar em imóveis alugados. E os eleitos são sempre os que têm mais “a sua cara”.

A estratégia é acertada. Investir em peças com toque nacional, ou carioca, também pode ajudar a encantar o turista estrangeiro. E, na hora de escolher o que comprar, o certo é apostar em peças funcionais, bonitas e, de preferência, baratas. Mas é possível?

— Sim! A gente consegue fazer uma mistura de materiais que dá certo. Quer dar um charme na cozinha? Pode botar ladrilho hidráulico apenas num pedaço do piso. O colchão precisa ser bom. Mas a cama, nem tanto. Não precisa ser a mais cara do mercado. Pode ser só uma cama básica — exemplifica Lisete Gomes, que nos últimos meses reformou ao menos cinco imóveis apenas para a Copa do Mundo.

Fonte: Jornal O Globo – 27/04/2014