Na hora de adquirir a casa própria, é aquela empolgação para fechar logo a compra. Tudo é lindo e azul. Mas se for preciso desfazer o negócio… é aquela dor de cabeça. Se é difícil voltar atrás na compra de qualquer produto, imagine na aquisição de um imóvel. Casos de desistência da compra de imóveis antes da entrega são mais comuns do que se imagina. E nem sempre fáceis de resolver.

Segundo especialistas, consta no Código Civil o direito de arrependimento da compra e, portanto, o consumidor pode sempre desistir. Entre os motivos mais comuns do rompimento estão a incapacidade financeira do comprador em arcar com as prestações assumidas (incluindo aí situações como desemprego e problemas de saúde que exigem um dinheiro imediato) ou atraso na entrega por parte da construtora.

Outras hipóteses são a de desrespeito ao que foi prometido no ato da venda, como, por exemplo, duas vagas de garagem sem obstrução, mas que, na realidade, são vagas onde um carro prende o outro. Ou o uso de materiais diferentes do que consta no memorial de incorporação. Mas e como proceder, quais os direitos e deveres do comprador e da construtora?

Se comprador é quem desiste, perde-se o sinal

 No caso em que a empresa não cumpriu com suas obrigações, o comprador deve receber tudo o que pagou e mais um pouco: sinal, prestações, intermediárias e mais uma multa por danos morais. O advogado Jorge Passarelli acrescenta que caso o atraso tenha prejudicado alguém que pague aluguel, por exemplo, a empresa tem ainda que ressarcir o que foi gasto com esta despesa pelo período de atraso.

Já se a desistência for por parte do comprador, o mesmo perde o sinal e deve receber entre 75% e 80% do valor pago pelo imóvel. José Geraldo Tardin, presidente do Instituto de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), explica que no caso de desistência por parte do consumidor sempre haverá multa, porém, se ela for abusiva, é preciso recorrer a justiça para revisá-la.

– Se for por culpa da construtora, o comprador tem o direito a receber todos os valores pagos, devidamente corrigidos, sem prejuízo da apuração de eventuais prejuízos, como lucro cessante e danos morais. Se não for por culpa da construtora, é necessário ver o que reza o contrato. A jurisprudência se firmou no sentido de que é possível a retenção de até 25% dos valores pagos, desde que previsto contratualmente, de forma clara – explica o advogado Armando Miceli Filho.

O presidente da Associação dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi), João Paulo Matos, explica que o procedimento é bem desvantajoso para as construtoras:

– A rescisão é um grave problema para a construtora, mas é direito do consumidor. Vamos imaginar uma situação normal, sem atraso de entrega, em que o cliente não quer mais o imóvel e ele tem direito a rescisão de 85%. A construtora não pode simplesmente cancelar o contrato quando quiser. É um acordo entre duas partes que, se rompido, é prejudicial para uma delas – diz Matos, acrescentando que é comum investidores comprarem o imóvel e revenderem para ganhar até 20% do valor injetado e que, caso não vejam valorização, desistem da compra.

Entretanto, Passarelli pondera que se tem o lado do interessado que compra por impulso, as empresas também investem em um marketing intenso e nem sempre esclarecedor, levando o consumidor à compra imediata e por isso arrependimento.

 Grave a conversa, leve testemunhas e guarde o folder

Passarelli orienta que não se compre um imóvel sem antes analisar a proposta com calma e verificar o contrato. E no caso de divergências sobre o que foi prometido e entregue, o ideal é ter provas.

– A orientação é se certificar previamente e com muita cautela da capacidade de pagamento. A segunda sugestão é que, durante o fechamento do contrato, o comprador leve uma testemunha, grave a conversa ou peça por e-mail a formalização de tudo o que foi prometido para se ter provas, caso haja alguma divergência depois. Também é importante guardar os folders de propaganda. O que acontece muito, por exemplo, é informar uma metragem na venda e na entrega o imóvel é menor. Estes itens ajudam a provar o combinado – sugere o advogado.

Outra saída para quem quer desistir de um imóvel antes da entrega é vendê-lo para outra pessoa.

– É possível sim vender o imóvel para outro, porém, sempre com anuência da construtora no contrato de compra e venda. No caso de rescisão, até a citação pela justiça, o consumidor tem de manter a adimplência, e após a citação não precisa mais efetuar o pagamento – explica Tardin.

Matos lembra, ainda, que a rescisão é só do contrato de compra. Portanto, se o empréstimo foi concedido por um banco, isso deve ser resolvido na instituição. Somente se foi concedido pela própria construtora é que tudo será cancelado

Fonte: Jornal O Globo Online – 13/03/2014