Era dezembro de 2006, quando Alberto Gomes estava sentado no aeroporto de Brasília e, minutos antes de embarcar no avião com destino ao Rio, recebeu uma ligação.

– Alberto, você aceita comandar a operação na África? – ouviu, surpreso.

Do outro lado da linha estava o diretor da ONG inglesa ActionAid no Brasil, que via Alberto como o nome ideal para ser um dos líderes da organização que combate a pobreza em mais de 40 países.

Sentado em seu escritório, o presidente da Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro (Cdurp) relembra:

– Eu trabalhava há seis anos na ActionAid e queriam usar minha experiência para levar os serviços da ONG a Moçambique – diz. – Liguei em seguida para minha mulher, que disse que viajaria comigo. Quando o avião pousou no Rio, sabia que tinha que ir para casa fazer as malas rumo à África.

Menos de um mês depois, ao chegar, com a mulher e o filho, a Maputo, Alberto viu o tamanho do desafio. Segundo ele, o foco era ajudar no combate à Aids, mas a falta de alimentos que a população moçambicana enfrentava era ainda mais urgente. Foram quatro anos de trabalho tentando fazer alianças com organizações comunitárias africanas que não tinham a experiência de trabalhar integradas.

– Como eu trabalhava em uma ONG internacional, fazíamos a ligação entre as ONGs locais e o governo africano. Implantamos diversos programas de combate à fome e à Aids. Fui um unificador de forças – define.

Apesar de falar com desenvoltura sobre sua atuação na África, Alberto se diz tímido quando precisa conversar com jornalistas. Foi assim que começou a entrevista em seu escritório na Rua Sacadura Cabral, na Zona Portuária. É nesse endereço que fica a sede da Cdurp, empresa da prefeitura da qual Alberto é presidente desde 2012, quando substituiu o engenheiro Jorge Arraes. Aliás, foi o próprio amigo Arraes que o convidou para integrar o time da Cdurp, há quatro anos, assim que soube que Alberto havia retornado da África.

De 2010 a 2012, Alberto atuou como assessor especial da Cdurp, coordenando programas como o Porto Maravilha Cidadão. Entre outras frentes, o projeto foi o responsável por contratar profissionais que moram no Centro da cidade ou na Zona Portuária para trabalhar nas intervenções. Alberto aponta para o mapa da região e afirma que a “linha invisível” que separa a Zona Portuária do Centro deixará de existir.

– O primeiro passo para integrar a cidade foi fazer o próprio morador do Centro perceber que pode morar perto do trabalho. A segunda etapa será apresentar aos cariocas uma região que no passado estava abandonada. É mais uma missão de unificação que tenho que cumprir – diz, dando um sorriso, o único durante boa parte da entrevista.

ROTINA PESADA

Como presidente, sua rotina é acompanhar a execução de obras e serviços nos cinco milhões de metros quadrados da Área de Especial Interesse Urbanístico (Aeiu) da Região do Porto. Ele chega a ter mais de seis reuniões em um dia de trabalho, iniciando o expediente às 8h, mas sem hora para voltar para casa. Às vezes, antes de iniciar as três horas de sono que costuma ter durante a noite, ainda responde aos e-mails do prefeito Eduardo Paes.

A responsabilidade do projeto deixa Alberto em permanente tensão. Como ele próprio enfatiza, as obras no Porto não podem atrasar. Diante de tamanho desafio, Alberto mantém-se permanentemente de olho na tela do computador. Sempre que uma notificação sinaliza a chegada de mais um e-mail de trabalho na caixa de entrada, ele interrompe a fala por alguns segundos e checa seu conteúdo. Foram oito interrupções em apenas meia hora de conversa, mas em nenhuma delas ele perdeu a linha de raciocínio. A falta de tempo reflete-se até em detalhes simples. Sobre sua mesa de trabalho há um porta-retrato com uma paisagem londrina. Perguntado sobre o porquê da imagem da capital da Inglaterra, ele conta que ganhou o presente com a foto e ainda não teve tempo de trocá-la por outra mais pessoal.

Sempre que responde a uma pergunta sobre o Porto, Alberto faz questão de frisar a importância de inaugurar uma área que atraia a população. Essa constante preocupação reflete a formação em ciências sociais e os cursos de pós-graduação em sociologia urbana e trabalho em comunidade. Na década de 1980, lecionou geografia por oito anos em escolas privadas e da rede municipal. Os trabalhos relacionados às causas sociais continuaram quando foi convidado pela prefeitura de Angra do Reis para coordenar o programa de saneamento básico do município, onde permaneceu por oito anos.

O jeito sério de Alberto começa a se desfazer quando ele deixa o escritório para almoçar. Mais relaxado e sorrindo, enquanto caminha pelas ruas da Zona Portuária ele fala de lembranças da região. O pai trabalhava na Marinha Mercante e certa vez conseguiu levá-lo para passar a noite em um navio atracado no Porto. A mãe, costureira, costumava levá- lo para consultas no Hospital dos Servidores do Estado, a poucos metros da sede da Cdurp.

Nascido em 1959 em Padre Miguel, foi em Bangu que ele passou toda a infância e adolescência. Como até hoje os pais permanecem morando no bairro da Zona Oeste, Alberto percorre toda a cidade uma vez por mês para ir a Bangu, onde aproveita também para rever velhos amigos. Atualmente, mora com a mulher e o filho, Albertinho, de 20 anos, em um apartamento em Copacabana. Alberto tem ainda uma filha socióloga, de 28 anos, fruto de um relacionamento na década de 1980.

VALONGO, UM DOS LOCAIS PREFERIDOS

O almoço, feito em menos de meia hora, se justifica: ele tem uma reunião na sede da prefeitura. Nem consegue terminar o filé com fritas que pediu, pois o carro da Cdurp para levá-lo à Cidade Nova já o aguardava.

– É sempre assim, corrido – brinca, antes de abrir a porta e entrar no veículo.

Ao passar pelo Cais do Valongo, Alberto revela que o local é um dos seus preferidos no Porto.

– O cais é um dos legados das intervenções. Com a revitalização de toda a região, mais cariocas e turistas poderão conhecer um pouco da história do país. A Zona Portuária será exemplo para toda a cidade. Uma área de fácil acesso para os cariocas e turistas, que faz lembrar o passado e atende às necessidades do presente. A partir de 2016, com o fim das obras no Porto, o Rio estará mais unido – aposta Alberto Gomes.

 

Fonte: O Globo – 07/12/2014