Os novos caminhos que levam à Barra

Cercada por montanhas, a Barra da Tijuca sempre foi um bairro de difícil acesso. Seu isolamento era tão grande que, no século passado, foi consagrada como o “sertão carioca”. Mas hoje isso ficou para trás. A chegada dos BRTs, da Linha 4 do metrô, da via expressa Transolímpica, da duplicação do Elevado do Joá e de uma nova ciclovia à beira-mar facilitou os deslocamentos e tem levado muita gente a (re)descobrir esse pedação da Zona Oeste do Rio.

Quintal de todas as tribos, com seus 18 quilômetros de extensão, a Praia da Barra virou agora destino certo nos finais de semana. Apesar do aumento de frequentadores, o metro quadrado na areia é bem menos disputado do que o de Ipanema. Barraqueiros comemoram o crescimento de cerca de 20% na circulação dos banhistas. O lucro vai às alturas. Até os turistas têm optado por mergulhar em águas menos conhecidas.

– A Praia de Copacabana estava muito poluída. Aqui na Barra, a limpeza é maior. É mais agradável – disse o brasiliense Leandro Schröeder, que mesmo hospedado em Copacabana optou por embarcar a Linha 4 no último final de semana, acompanhado da mulher e da filha.

A nova onda na Barra é também a disputa por um lugar no mar. No último final de semana, os surfistas Natan dos Santos e Luiz Matheus, ambos de 19 anos, decidiram deixar para trás a marola do Arpoador e seguiram rumo à Barra.

– Chegamos ao Arpoador e não tinha onda – contou Natan, que vinha da Tijuca. – Então, viemos de metrô rapidinho para ver se conseguimos entrar aqui ou chegar de ônibus até a Prainha. Agora, fica mais rápido conhecer outros lugares para surfar.

No último domingo, um grupo de amigos que mora no Irajá também usou o metrô para ir à praia. A turma embarcou na Pavuna e desceu na estação Jardim Oceânico em busca de um lugar ao sol.

– A linha é nova e muita gente ainda não sabe que aqui é mais vazio. Mesmo demorando meia hora a mais para chegar do que à Zona Sul, vale a pena pela tranquilidade – conta a administradora Ana Carolina Machado.

A ligação metroviária completa hoje seis meses de funcionamento – durante a Olimpíada e a Paralimpíada, operou de forma restrita para credenciados e portadores de ingressos. De acordo com a concessionária Metrô Rio, a estação mais movimentada é, justamente, a Jardim Oceânico, que recebe, por dia, uma média de 110 mil passageiros. Já o BRT Transoeste carrega 50 mil pessoas por dia só no chamado Lote Zero, entre o Terminal Jardim Oceânico e o Barra Shopping. Já a Transolímpica, nova via expressa que conta com um BRT, ligando o Recreio a Deodoro, recebe, em média, cerca de 60 mil veículos por dia.

Para muitos barrenses, diante das novas opções, depender dos automóveis ficou no passado. Se antes os ônibus dos condomínios levavam os moradores até o Centro, hoje deixam na porta da estação Jardim Oceânico para que prossigam a viagem debaixo da terra. Bem em frente à estação, um serviço de mototaxistas foi montado há cerca de um mês, conforme revelou o colunista Ancelmo Gois. A garupa tem sido a opção para quem quer chegar mais rápido em casa ou ao local de trabalho.

– O horário de maior movimento é de 17h30m às 20h, justamente na volta para a casa, quando a Avenida das Américas está toda engarrafada – conta o mototaxista Jeferson Bernardes.

Com a facilidade nos deslocamentos, as queixas sobre o aumento da violência também aumentaram. Até um grupo de justiceiros foi criado na tentativa de frear a criminalidade.

– Não sou contra metrô, para mim foi uma mão na roda. Mas os assaltos aumentaram muito. A Barra está insuportável. Não tem segurança – reclama um lutador de MMA.

Se antes os criminosos que realizavam assaltos na Barra vinham, em sua maioria, da Rocinha e da Cidade de Deus, agora chegam de moto e de carro pela Linha Amarela e pela Transolímpica, de acordo com o delegado-titular da 16ª DP (Barra da Tijuca), Marcus Vinicius Braga:

– A Barra ainda é um local tranquilo para se viver. A mancha criminal é muito pequena. Mas agora ficou muito fácil vir para a Barra. Tem metrô, BRT e Transolímpica. Como o acesso melhorou muito, vêm pessoas boas e ruins. Temos agora que monitorar os criminosos que não vêm mais da Rocinha e da Cidade de Deus, mas da Zona Norte. No Jardim Oceânico, é pior, porque o metrô é ali.

O administrador do “Alerta Jardim Oceânico”, que não quis ser identificado, conta que, há quatro meses, decidiu criar a página no Facebook para ajudar a combater a violência na região. Segundo ele, a polícia não conseguiu acompanhar o crescimento da Barra:

– É claro que o aumento de fluxo de pessoas numa determinada localidade chama a atenção. O bandido não vem de metrô nem de BRT, mas o fato de ter mais gente gera um aumento de ocorrências. É preciso aumentar o policiamento na mesma proporção. A PM tem feito o trabalho dela de forma bastante correta, mas sabemos que o cobertor é curto. A gente precisa que a guarda municipal também reforce a segurança.

VENDAS DO COMÉRCIO ESTAGNADAS

Presidente da Associação de Moradores da Barrinha e do Quebra-Mar, Marco Ripper também clama por um aumento do efetivo:

– Esse crescimento é fantástico, mas a segurança em si não acompanhou. Havia locais que eram muitos familiares, isso acabou. As pessoas não querem sair mais de casa com medo da violência.

As vendas no comércio também não deslancharam, mas o motivo, nesse caso, é a crise econômica. Para o presidente da Associação Comercial da Barra , o ex-senador Ney Suassuna, o cenário poderia ser até pior se não tivesse acontecido o aumento de frequentadores:

– Só os estabelecimentos mais tradicionais conseguiram se manter com a crise. Mas não dá para dizer que houve um crescimento nas vendas. Talvez as vendas tivessem sido menores se não tivesse aumentado o fluxo de pessoas na Barra – ponderou.

VIA EXPRESSA COMPLETA 20 ANOS

Primeira via expressa da cidade com cobrança de pedágio, a Linha Amarela completa em novembro 20 anos de funcionamento. Além de desafogar o trânsito na Estrada Grajaú-Jacarepaguá e na Lagoa-Barra, também facilitou a chegada de moradores da Zona Norte, que passaram a frequentar, em peso, a Praia da Barra. Incomodados com o aumento de movimento nas areias, alguns moradores da orla chamavam os visitantes de “yellows”, numa referência à Linha Amarela.

Antes da inauguração da via expressa, de 25 quilômetros, que liga a Ilha do Fundão à Barra, um morador de Água Santa precisava pegar dois ônibus e viajar durante duas horas até chegar à praia.

– Quando eu puder ir à Barra ou ao Recreio de ônibus pela Linha Amarela, vai ser uma beleza. Vou dar adeus à Ipanema – disse à época o bodyboarder Júlio César Nunes, que viu a maré melhorar pouco tempo depois.

Fonte: O Globo – 19/03/2017