O Museu do Amanhã, com sua arquitetura icônica, ousada e polêmica e conteúdo extremamente inovador, tem como tema o ambiente em que vivemos. Sua construção e curadoria baseadas em experiências de forte impacto exigem horas de navegação. Com linguagem altamente tecnológica, atrai uma visitação recorde e marca um novo tempo para os museus de ciência.

Em outra ponta, num espaço urbano tão relevante para a História, na Quinta da Boa Vista, o museu mais antigo do país, criado em 1818, luta pela sobrevivência com carência de recursos. Vinculado à educação e à pesquisa, enfrenta obstáculos para garantir o básico, como limpeza e segurança, comprometendo a visitação.

Em São Paulo, um incêndio de grandes proporções fez com que um raio caísse pela segunda vez no mesmo lugar, destruindo o prédio do Museu da Língua Portuguesa, exatos 70 anos após um incêndio criminoso. A reconstrução da ala então incendiada foi o que permitiu a adaptação do prédio, também icônico, para celebrar o patrimônio dos brasileiros e de toda a comunidade lusófona. Tinha excelente visitação. Também em São Paulo, o Museu do Ipiranga aguarda recursos para possibilitar sua recuperação, sem previsão de reabertura.

Essa rápida análise nos remete a uma inevitável reflexão: os museus têm um ciclo de vida finito, seja por acidentes, gestão, financiamento ou simples decadência física e tecnológica. Se de fato isso ocorre, e parece- nos difícil buscar exemplos que provem o contrário, os novos precisam ser concebidos com esse horizonte temporal. Os consolidados têm em seu histórico a renovação e a reinvenção, mas essas instalações serão sempre temporárias.

Ora, um museu é uma instituição de interação com patrimônios de natureza diversificada e de valores considerados únicos. Como podemos tratar esses patrimônios que devem atravessar gerações com instalações temporárias? Se examinarmos do ponto de vista do conteúdo expositivo, portanto do patrimônio que se propõe a preservar, o Museu do Amanhã não seria o sucessor direto do Museu Nacional? O Museu da Língua Portuguesa não terá sido um sucessor do Museu do Ipiranga enquanto celebração do povo brasileiro? Se buscarmos exemplos internacionais, verificaremos que Louvre, Tate, Prado, Reina Sofia, MoMA, entre outros, foram renovados, ampliados, e muitos ganharam filiais em outras cidades, recebendo novos públicos.

Outro aspecto decorrente dessa reflexão é que os prédios devem ser flexíveis e poder se adaptar a essas demandas de verdadeiro renascimento, já que, do ponto de vista do conteúdo, está comprovado o interesse do público e a relevância para as cidades, contribuindo para a revitalização urbanística.

Novos museus são, portanto, necessários e podem sim coexistir com os mais antigos. O que se pretende é que o Museu do Amanhã e o Museu Nacional sejam complementares, assim como coexistiram ( e devem ainda coexistir num futuro próximo) o Museu Paulista e o Museu da Língua Portuguesa. Essas instituições precisam constituir uma rede bem integrada, e a gestão pública deve envidar esforços e recursos a todos eles, buscando atrair também o financiamento privado a toda a rede, e não apenas àqueles que momentaneamente têm a visibilidade e que um dia também serão superados.

 

 

Fonte: O Globo – 26/01/2016