A parte central da Vila Cruzeiro, favela no bairro da Penha, na Zona Norte do Rio, será pintada por dois artistas holandeses: Jeroen Koolhaas e Dre Urhahn. Como antecipado pelo GLOBO, os dois artistas buscavam financiamento de US$ 100 mil para o projeto Favela Painting, valor que foi ultrapassado na tarde desta terça-feira por meio do site de crowdfunding Kickstarter. O projeto alcançou a marca há dois dias do fim do prazo estabelecido pelo site. Recursos adicionais permitiriam aos artistas pintar por mais tempo. Em entrevista por email, Koolhass havia dito que o ideal seria acumular US$ 250 mil em recursos, o bastante para pintar por um ano inteiro.

– Planejamos começar a pintar na primeira metade de 2014 e queremos continuar pintando enquanto tivermos fundos – afirma Koolhaas.

Koolhaas explica que o projeto surgiu depois de os dois irem pela primeira vez à comunidade, em 2005. Eles estavam no Brasil para filmar um documentário sobre o papel do hip-hop na vida de jovens de áreas pobres.

– Entrevistamos muitas pessoas em diferentes favelas do Rio e de São Paulo e ficou evidente que os jovens de favelas têm uma visão muito madura e bem informada a respeito de sua própria situação. A maioria parecia orgulhosa de suas origens, enquanto em áreas mais ricas a atitude em relação às favelas era de medo e apreensão – conta Koolhaas.

Para ele, o contraste entre as duas visões da favela poderia ser amenizado caso a comunidade se mobilizasse em torno de um projeto artístico.

– Se conseguirmos pintar toda a comunidade, em conjunto com os moradores, talvez as pessoas de fora reconsiderem a visão que têm.

Não será a primeira pintura dos dois na Vila Cruzeiro. Em 2008, eles pintaram peixes gigantes na escadaria do local e um menino soltando pipa na lateral de algumas casas. No morro Dona Marta, em Botafogo, eles pintaram 7.600 metros quadrados de fachada na Praça Cantão, em 2010.

Benfeitor deu US$ 5 mil

O projeto dos dois está no Kickstarter desde o dia 24 de setembro e neste período acumulou contribuições de mais de 1,5 mil pessoas. A maior parte investe pouco, entre US$ 1 e US$ 50, o que dá direito a cartões-postais exclusivos com obras da dupla, retratando pinturas feitas no Rio. Um dos financiadores, porém, deu US$ 5 mil. Em troca, ele terá direito a passar um dia com os dois artistas.

Koolhas afirma ainda que existe a possibilidade de manter o projeto por meio de outras formas de financiamento. Segundo ele, não está descartada a possibilidade de conseguir recursos por meio de leis de incentivo brasileiras. Segundo Koolhaas, eles chegaram a procurar a prefeitura para buscar apoio para o projeto, mas as conversas não avançaram. Ele espera que o projeto funcione de forma independente, em modelo similar ao que a dupla montou na Filadélfia, nos EUA. Lá, uma iniciativa semelhante tem funcionado de forma autônoma, tocada por membros da comunidade, usando modelos e conceitos deixados pelos artistas.

– Esperamos que o Favela Painting também se torne autônomo. Temos planos de fabricar e vender localmente tintas com a marca Favela Painting. Assim, ele poderia se financiar sozinho.

Koolhaas afirma que a intenção é empregar, inicialmente, entre dez e 20 pessoas da comunidade para ajudar na pintura. O artista diz ter boas relações com a associação de moradores da Vila Cruzeiro e não acredita que terá dificuldade em conseguir permissão para pintar.

– A impressão geral é de que eles nos querem de volta para mais projetos. Eventualmente conversaremos com os moradores em cada uma das casas para trabalhar com eles nos designs e receber aprovação final.

 

Fonte: Jornal O Globo, 30/10/2013