De que forma a adoção deste programa pode contribuir para a reputação do profissional 

Diante das exigências legais e da complexidade das negociações imobiliárias, a atuação do corretor de imóveis é sempre cercada de grande responsabilidade, podendo sofrer sanções penais quando não age preventivamente, sem analisar os riscos que podem prejudicar os clientes.
Assim, é importante entender o cenário de que proceder de maneira a verificar e minimizar as possibilidades de erros e desvios de conduta são os caminhos para manter intactas a reputação profissional.

Nesse sentido começa a ganhar força no mercado imobiliário a implantação de programas de Compliance, uma palavra não muito comum, mas que pode representar um diferencial quando adotada.

Em linhas gerais, representa ações para estar em conformidade com a legislação. Tratam-se de medidas adotadas para prevenir atividades ilícitas e descumprimento de lei dentro das organizações.

 – Como hoje no Brasil o item principal da pauta da sociedade é o combate da corrupção e da lavagem de dinheiro existe uma tendência de analisar este programa apenas para identificação destes dois problemas. Mas acima disso, precisa-se entender o Compliance não apenas no sentido de evitar a corrupção seja ativa ou passiva, prevista no Código Penal, mas também no sentido de deterioração, de decomposição que pode ser consequência de descumprimento de legislação, de atos de corrupção, mas também de desvios éticos ou comportamentais. Portanto é muito mais que um combate às práticas de corrupção, são instrumentos corporativos de combate à deterioração profissional – comenta o advogado e especialista em Compliance, Luis Fernando Marin em entrevista para a Tv Creci Rio.

É uma questão de necessidade, já que se tem atualmente uma legislação relacionada ao crime de lavagem de dinheiro, que é a Lei 9.613/98, com redação atualizada pela Lei 12.683/12, que descreve no artigo 9º uma obrigação relacionada a todos que atuam na área de consultoria e assessoria referente à aquisição de imóveis de informar ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) ou ao órgão regulador da profissão, o Conselho Federal de Corretores de Imóveis (Cofeci), eventuais transações suspeitas.  Portanto é inevitável, se não a implantação completa do programa de Compliance, até mesmo levando em consideração do corretor de imóveis ser um profissional liberal e autônomo, mas atividades deste programa, ou seja, checar se a atuação está conforme a legislação, se visa uma atuação  de prevenção de riscos.

A Resolução Cofeci 1.168/2010 determina alguns procedimentos que precisam ser observados pela empresas imobiliárias para cumprirem as obrigações descritas na Lei acima e as respectivas alterações.

De acordo com o Conselho de Controle de Atividades Financeiras configuram-se como operações suspeitas transações imobiliárias:

  1. I) transações imobiliárias ou propostas que, por suas características, no que se refere às partes envolvidas, valores, forma de realização, instrumentos utilizados ou pela falta de fundamento econômico ou legal, possam configurar indícios de crime.;

 (II) transação imobiliária incompatível com o patrimônio, a atividade principal desenvolvida ou a capacidade financeira presumida das partes.;

 (III) recebimento de recursos com imediata compra de instrumentos para a realização de pagamentos ou de transferências a terceiros, sem justificativa; e

 (IV) movimentação de recursos incompatível com o patrimônio, a atividade econômica e a capacidade financeira

Ainda segundo o COAF trata-se de uma forma de lavagem de dinheiro quando a compra de imóveis é realizada com recursos de origem ilícita, com valores oficialmente menores  que os valores pagos. A diferença entre o valor da transação e o valor declarado é paga em espécie e, em seguida o imovél é vendido pelo valor de mercado.

Segundo Marin, um programa de Compliance ajuda a conduzir o negócio com mais qualidade e em conformidade com a legislação, se atentando para a necessidade  de realizar as devidas diligências referentes à atuação, de possuir um cadastro atualizado dos clientes e das negociações efetuadas e até mesmo produzir uma Declaração de Inocorrência, caso não tenha acontecido nenhuma transação suspeita no ano anterior.

– Trata-se muito mais de uma questão de necessidade do que de benefícios, mas adoção de prevenção de atitudes ilícitas, de promoção da boa fé nas relações contratuais, promoção das condutas éticas, evidente que essas atividades vão proporcionar vantagens competitivas, não apenas ligadas à prevenção dos riscos, mas também os riscos reputacionais – explica Luis Fernando Marin.

A reputação é um ativo de extrema importância dentro de uma empresa. Nesse cenário, empresas e clientes vão se negar a fazer negócios com profissionais que apresentarem desvios éticos e vão dar prioridade para empresas que investem em Compliance preventivo de riscos e proativo de promoção de ética e da boa fé.

Uma área de Compliance para ser estruturada segue basicamente a ideia previamente estabelecida por especialistas do setor.

Para obter sucesso no processo de implantação de um programa de Compliance dentro de uma imobiliária é necessário que desde a alta administração, diretoria e gestores estejam imbuídos de que a criação desta área é importante para o crescimento da organização e que os mesmos devem servir de exemplo para a aplicação das normas.

É necessário entender que, visando uma atuação em conformidade com os padrões éticos e legais e buscando evitar desvios e ações que podem acarretar em problemas para a instituição, a aplicação do Compliance tem o objetivo de repensar as formas de atuação, o que muitas vezes pode ser mais complexo para profissionais que trabalham da mesma forma há bastante tempo.

De acordo com Marin, em um processo de estruturação do Complaince, a primeira questão é conhecer com profundidade o ramo principal da empresa. No caso de uma imobiliária, a pessoa  ou grupo que estiver à frente da implantação do programa precisa conhecer o negócio, as particularidades da corretagem de imóveis, da administração imobiliária porque para você ser conforme à legislação é preciso conhecer as especifidades da atividade. Portanto o que é uma corretagem de imóveis ética, de acordo com a lei e de boa-fé? Esta é uma questão tratada como fundamental.
O segundo passo é avaliar os riscos, ou seja, os principais pontos que podem proporcionar problemas para empresa e para o cliente.

– Na questão da administração de imóveis, por exemplo, um ponto sensível, que merece uma atenção especial, é o cadastro do candidato a inquilino do imóvel, para saber se reúne condições de ser o locatário do imóvel. Na aquisição de imóveis deve-se avaliar se o interessado tem, de fato, condições e capital para comprar a unidade. São situações sensíveis onde há uma probabilidade maior de surgirem desvios legais ou éticos – aponta Marin.

O terceiro ponto é a adoção de códigos internos de conduta. A profissão de corretor de imóveis tem o seu próprio Código de Ética e o profissional precisa acessá-la constantemente. Mas é recomendado também estabelecer normas próprias da empresa, de acordo com a cultura da instituição.
Após a adoção e consolidação desses procedimentos, outros passos posteriores precisam ser implantados como ações de controle internos e externos em relação ao pontos apontados na avaliação de riscos, deixando explícito os parâmetros que devem ser adotados para que não haja violação da lei e da ética. Em relação ao controle externo, uma preocupação permanente na escolha de fornecedores, novos profissionais e avaliação criteriosa de canditados a comprador e locatário, são exemplos.

Na medida que se define iniciativas de controle interno e externo, uma fase de treinamento e comunicação perante os profissionais precisa ser adotada para que possam atuar de acordo com as premissas adotadas.

Com o programa de Compliance já estruturado vem a fase de investigação de eventuais condutas que violariam preceitos legais e o monitoramento desse resultado.

– Não basta ter um programa de Compliance. É necessário ter um programa efetivo ou então representa um investimento à toa. Muito provavelmente um programa onde não há denúncias de irregularidades não está funcionando. É através do Compliance que se consegue previnir estas situações de risco e quando acontecer que seja feita a devida investigação sem causar constrangimentos, exposição de imagem e protegendo aquele que denunciou – destaca Marin.

Costuma-se usar muito em programas de Compliance os chamados Canais de Denúncias. E nessas fases mencionadas o canal de denuncia está na adoção de controles ou investigação e monitoramento. É importante para serem identificadas ações que não são condizentes com os parâmetros da empresa.

Para ser totalmente Compliance é preciso seguir à risca todas as normas e atuar conforme à legislação. O Compliance que antes era visto como custo, hoje em dia as empresas estão começando a avaliar como um investimento de manutenção e construção de uma reputação positiva. Cumprir regras representa minimizar perdas e danos.

Cada vez mais o Compliance vem se destacando também como um mecanismo de análise prévia da viabilidade do negócio, através de uma criteriosa avaliação dos riscos inerentes à uma negociação imobiliária, e como um processo permanente de aprimoramento dos procedimentos internos adotados em um trâmite de aquisição de imóveis.

Da mesma forma, o acompanhamento e gerenciamento dos contratos deve ser permanente, buscando minimizar a possibilidade de erros que podem acarretar em prejuízos para os clientes e consequentemente para a credibilidade da empresa ou profissional.

Com a deflagração da operação Lava Jato há três anos, que investiga o maior esquema de corrupção e lavagem de dinheiro no país, as políticas de Compliance se tornaram mais significativas dentro das empresas do segmento da construção civil como maneira de prevenir práticas inadequadas. A falta de ética e de iniciativas de monitoramento podem ser fatais para ações prejudiciais para a organização, como subornos e superfaturamentos de obras. Já o contrário, ou seja, a adoção de práticas criteriosas, que deixam estabelecidos processos de atuação e procedimentos contribuem para uma linha de trabalho condizente com normas e leis, evitando condutas antiéticas.