Quem caminha pela Avenida Marechal Floriano, no Centro, tem a sensação de voltar ao século passado. Em cada esquina é possível encontrar um estabelecimento bem antigo, que, mesmo com dificuldades, resiste ao tempo. Alguns já acharam alternativas para atrair mais clientes, mas a maioria deposita as esperanças nas obras de revitalização da Região Portuária, que chegarão à avenida no primeiro semestre de 2015.

 

Ao entrar no Principado das Louças, uma surpresa: o espanhol Aníbal Gonzales Garcia, de 83 anos, que fundou a loja em 1959, continua trabalhando firme e forte. Conta que veio para o Rio por causa de sua paixão pelo futebol. Em 1950, resolveu arrumar as malas depois de ver o Vasco da Gama jogar na Espanha. Após trabalhar numa oficina de lapidação de cristais, em Botafogo, abriu o próprio negócio, que hoje emprega 140 pessoas, além de filhos, genro e netos, e tem 20 mil itens à venda. Ele espera que a reurbanização traga mais clientes. Sua filha Selina também alimenta essa esperança.

 

– Hoje, os turistas estrangeiros só tiram fotos. A gente quer que eles entrem na loja e passem mais tempo no Centro – diz Selina.

 

Contas difíceis de fechar

 

Inaugurada em 1929, a loja Ao Bandolim de Ouro era muito frequentada por Jacob do Bandolim e pelo mestre do cavaquinho Waldir Azevedo, conta Daniela do Souto, neta do fundador Miguel Jorge do Souto. Com um pequeno ateliê de instrumentos de corda funcionando no imóvel de três andares, ela diz que tem dificuldades para fechar as contas:

 

– Temos 11 funcionários e gastamos, com aluguel e IPTU, R$ 10 mil por mês. Cada cavaquinho ou violão leva cerca de três meses para ficar pronto. É um processo artesanal que usa uma mão de obra que não se renova. Somos um comércio diferenciado. Espero que a revitalização atraia mais gente.

O português Manuel Pinho Santos, que fundou a Sapataria Sousa há cinco décadas, também luta para manter seu comércio, onde trabalham quatro pessoas com mais de 65 anos.

 

– Fabricamos os sapatos aqui, mas é uma profissão que está acabando. Muitos deixaram de vir por medo da violência. Quem sabe a reurbanização não trará um pouco daquele antigo Rio de volta? – diz o comerciante.

 

A Livraria Elizart, inaugurada em 1972, resiste no mercado oferecendo grande variedade de livros e revistas. Arthur Reis, neto do fundador Manuel Mattos, conta, com orgulho, que o ator José Wilker era um dos frequentadores da loja. Hoje, a clientela é formada basicamente por alunos do Colégio Pedro II e da Universidade Estácio de Sá, que buscam mangás e livros técnicos.

 

– Outro dia, minha irmã foi assaltada quando saía da loja. A violência afasta, sim, as pessoas. As obras poderão ajudar a mudar isso – afirma Reis.

 

Fonte: O Globo – 03/11/2014